Edição 199 Setembro/2018

vida boa

Diário de uma motociclista

Ao se aposentar em 2015, Maria Alice passou a ter mais tempo para se dedicar a uma grande paixão: o motociclismo

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Costumo dizer que tenho duas vidas. Uma delas eu vivi até os 50 anos, quando me aposentei. Ingressei no Banco do Brasil muito nova, com apenas 18 anos. Era um sonho sendo realizado. Meu pai era funcionário do Banco e, desde pequena, o acompanhava algumas vezes ao trabalho. Por volta dos 10 anos, deixei as aulas de piano para fazer um curso de datilografia. Eu realmente fui criada para ser funcionária do BB.

Em 1986, prestei concurso para o Banco e, em 1987, tomei posse na agência central de Brasília, na área de Captação. Durante os anos em que me dediquei ao BB, me desenvolvi muito profissionalmente: fiz faculdade de Contabilidade, mestrado em Finanças, e outros cursos de especialização. Meu objetivo era atuar na área de Crédito, para mim a mais nobre do Banco. Trabalhei a vida inteira com Crédito e fui muito feliz.

Em 2015, com o lançamento do Programa de Aposentadoria Incentivada (PAI), veio a oportunidade de me aposentar. Assim, aos 50 anos, comecei minha nova vida. Nunca tive muito tempo livre porque sempre me dediquei ao trabalho. A aposentadoria me trouxe a chance de viver a vida que eu sempre sonhei.

Essa nova etapa é como uma premiação por tantos anos de dedicação ao BB. E a Previ, plano de previdência excepcional, tem papel fundamental nisso tudo. Afinal, é a instituição que complementa meu rendimento hoje. Se eu dependesse apenas do INSS, teria um salário muito menor. No entanto, como sempre tive um bom salário, minha perda depois de aposentada foi relativamente pequena.

Digo que eu só ganhei no BB. Hoje, estou sendo recompensada por todo profissionalismo e comprometimento em 29 anos e meio. Lembro com carinho daquele tempo, mas agora só quero me dedicar a mim mesma, à minha família e a outras atividades.

Motociclismo: uma paixão

Nessa nova vida, também tenho mais tempo para me dedicar a uma grande paixão: o motociclismo. Lembro-me até hoje de que, ainda criança, andava na garupa da moto laranja do meu avô. Em 1987, mesmo ano em que comecei a trabalhar, aprendi a pilotar e comprei minha primeira motocicleta. Mas logo a deixei um pouco de lado, pois aproveitava o tempo que tinha para estudar e me dedicar ao trabalho.

Anos depois, conheci meu marido, que é harleyro (amantes da moto Harley Davidson). Tivemos nossa filha, a quem me dediquei, e só voltei a pilotar em 2011, quando ela já estava com 12 anos. Nessa época, lembro de uma conversa que tive com minha mãe. Disse a ela que, em cinco anos, eu me aposentaria e compraria minha tão sonhada Harley Davidson. Você acredita que ela me disse para não esperar tanto tempo e comprou a moto para me dar de presente?

Hoje, tenho duas motos: uma para andar pela cidade e outra própria para estrada. Para mim, ser harleyra é um estilo de vida. Ao andar de moto, vivo inúmeras histórias, aprendo coisas novas e me torno uma pessoa melhor. O motociclismo me inspira todos os dias. E daqui a 100 anos, quando eu nem estiver mais aqui, quero inspirar outras mulheres para que elas também invistam nessa paixão.

Acredito que nossa vida é uma constante superação e para nós, mulheres motociclistas, enfrentar uma sociedade machista é um dos maiores desafios. Não ligo para quem diz que motociclismo é coisa de homem. Nós também podemos fazer o que quisermos. Já fiz algumas viagens de moto só com mulheres e é sempre muito divertido. Na última, fui com um grupo de cinco amigas para Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Saímos bem cedo e vimos o dia amanhecer na estrada. É um momento tão emocionante. Adoro viajar de madrugada e ver o nascer do sol. Me percebo como parte da paisagem, sinto o calor chegar e sempre faço uma oração.

Muitas vezes me perguntaram se não tenho medo. Costumo responder que, quando se domina o equipamento, o medo é sempre superado. Todos nós temos uma coragem que nem sabemos. Por isso, é preciso se desafiar constantemente. É isso que faço. Pelo menos uma vez ao ano, tento fazer algo que nunca fiz. Gosto de me reinventar.

Novas experiências

Agora, por exemplo, estou vivendo uma nova experiência em virtude da minha vida como motociclista. Tenho um  Instagram em que divulgo fotos das minhas viagens de moto e isso me coloca em contato com muitas pessoas. Tanto que a agência de modelos Ü Models Brasil, aqui de Brasília, viu minhas fotos e me ligou. No início, achei que era brincadeira. Hoje, faço parte do casting da agência. Isso foi realmente algo que eu não esperava, mas se tornou uma grata surpresa. Também gosto muito de todas as formas de arte: pintura, música, fotografia, literatura. Não me considero escritora, mas já tenho textos publicados em 14 livros.

Nesse momento, estou me dedicando ao mergulho. Fiz treinamento e, quando quero, alugo o equipamento e vou praticar. Agora, estou programando uma viagem específica para fazer mergulho. Comecei também a aprender treinamento de apneia, que considero um esporte muito interessante.

Além disso, faço curso de mecânica. Aí me perguntam: para que, se você não vai consertar sua própria moto? Faço porque quero garantir que o problema detectado pelo mecânico está correto, porque pego estrada de moto e não quero deixar minha segurança na mão de outras pessoas, porque quero saber o que acontece com as minhas Harley Davidson.

Para mim, o fato de você aprender a fazer algo não significa que você vá fazer. Eu tenho habilitação AB, mas isso não quer dizer que vou dirigir ônibus ou caminhão. Eu não tenho lancha nem jet-ski, mas tenho licença para conduzir esses dois veículos. Agora, no segundo semestre, vou fazer um curso de mestre amadora para aprender a ler mapas náuticos. Ter essas habilidades não significa que vou fazer isso tudo, mas poderei, se eu quiser.

Por isso, sempre digo: faça, não desista! Se cair, levante e siga em frente porque você consegue. Coragem todos nós temos, só precisamos nos desafiar. Abra seus horizontes para saber do que você é capaz. Não aceite que o seu horizonte seja apenas o limite aonde disseram que você pode chegar.
 

Maria Alice Castro Monteiro, aposentada do BB
e-mail: alicedeharley@gmail.com
Instagram: @alice_e_sua_harley

A paixão de Alice pelo motociclismo

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