Edição 159 Junho/2011

Educação Financeira

Um aprendizado que começa na escola

Programa pioneiro no Brasil ensina noções de economia a crianças e jovens da rede pública

Comprar é um verbo que a maioria das pessoas, sejam jovens ou adultos, gosta de conjugar e praticar. Mas como adquirir bens e serviços de forma consciente, sem gerar dívidas impagáveis? Educar financeiramente os consumidores, desde pequenos, é o caminho para uma sociedade mais consciente e menos endividada, como garantem os especialistas. Eles indicam os principais fatores que levam ao endividamento no longo prazo: a pouca ou nenhuma habilidade para tomar decisões financeiras e obter crédito, e o  consumismo exagerado. 

Para Eliana Bussinger, mestre em Economia pela FGV e aposentada pela PREVI, é impossível ignorar a importância do dinheiro em nossa vida e, por isso, aprender a lidar com ele facilita o presente e permite planejar o futuro. Ela explica que, a partir do momento em que uma criança aprende as principais operações matemáticas, já se devem introduzir conceitos financeiros em seu dia a dia. “É preciso ensinar as pessoas, sejam elas crianças, jovens ou adultos, a utilizar o dinheiro de maneira eficiente no presente, buscando, ao mesmo tempo, criar uma cultura de poupar para realizar objetivos ou reduzir vulnerabilidades futuras”, alerta.

O governo tem se esforçado para garantir um futuro economicamente mais saudável por meio da Estratégia Nacional de Educação Financeira (Enef). Instituído em maio, por meio de decreto, o programa prevê uma série de iniciativas pedagógicas voltadas para os estudantes das escolas públicas, com o objetivo de erradicar o analfabetismo financeiro no país. Assuntos como orçamento doméstico, poupança, aposentadoria, seguros e financiamentos farão parte oficialmente do currículo escolar público a partir de 2012. “Os professores desenvolverão conteúdos adaptados para todas as turmas dos ensinos fundamental e médio”, explica Sérgio Jamal Gotti, diretor de Políticas de Formação, Materiais Didáticos e de Tecnologias para Educação Básica do MEC. E o mais interessante: “o conteúdo será distribuído pelas aulas de matemática, história, ciências sociais e até português. Não haverá uma disciplina específica”.

A rigor, desde agosto de 2010, a Enef é oferecida, por meio de projeto-piloto, em algumas escolas públicas do país. E o resultado positivo na vida dos jovens e de suas famílias já é notável. “A orientação ajuda na tomada de decisões quando os assuntos são monetários. Os alunos estão aprendendo a lidar com o dinheiro e estão orientando suas famílias, que já fazem orçamento doméstico e poupam seu dinheiro para realizar objetivos futuros”, comenta Gilvana Linhares, orientadora da Secretaria Estadual de Educação do Ceará.

Cristian Quijada Torres, especialista em Desenvolvimento do Setor Privado do Banco Mundial (Bird), afirma que, durante a aplicação do projeto, os alunos ampliaram seus conhecimentos sobre taxas de juros, empréstimos e financiamentos, pagamento mínimo de cartão de crédito, seguros e imposto de renda. “Isso não ocorreu por acaso. Verificamos que, por causa do programa, ocorreu esse aumento da alfabetização financeira”, disse.

Até 2012, programa será estendido a toda a rede pública

O MEC, em parceria com o Banco Mundial (Bird), a BM&FBovespa, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central, entre outras instituições, está levando a Enef para dentro das salas de aula. Com a distribuição de material didático para professores e treinamento via internet, 450 escolas nos Estados do Ceará, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Tocantins e do Distrito Federal passaram a oferecer Educação Financeira para mais de 12 mil alunos, desde agosto de 2010.  “E, em 2012, incluiremos o programa em todas as unidades públicas”, reforça Gotti. “A Educação Financeira não se resume a ensinar o consumidor a tomar crédito, mas inclui a verdadeira noção de cidadania. Ela abrange o planejamento de um projeto de futuro, que garanta melhores condições de vida; o controle do orçamento doméstico, para assegurar a estabilidade financeira da família; o incentivo à poupança, como instrumento de realização dos sonhos de consumo; o aprendizado de como investir no mercado de capitais para auferir lucro; e, de quebra, garantir uma economia mais sólida”, explica Juliana Barral, diretora da Universidade do Banco Central (BC), um dos parceiros da Enef.

Segundo Miriam Bruhn, economista do Bird, os números iniciais da Enef já são muito bons, mas é preciso lembrar que o programa completou apenas seis meses nas escolas, do total de três semestres do projeto-piloto. “Os resultados apresentados no primeiro semestre são muito bons, e a nossa expectativa é de mais evolução pela frente. O que fica muito claro é que os jovens que recebem aulas de finanças estão mais preparados para lidar com dinheiro e com os conceitos de gasto e poupança em seu dia a dia. Eles acabam por multiplicar esse conhecimento em casa, com os pais e os amigos, o que mostra a importância do trabalho”, revela Miriam, acrescentando que uma nova avaliação será feita no final deste ano.

Consumidores atentos

O trabalho da Enef mostra que os jovens brasileiros da rede pública do ensino médio são consumidores atentos. Eles consideram relevante, no momento de comprar um produto, questões como preço (71%) e benefícios que este pode trazer (51%). A maioria negocia descontos (57%) e pesquisa o produto em outras lojas antes de se decidir pela compra (87%). A pesquisa mostra que os jovens gastam principalmente com roupas (63%) e lanches (37%). As estudantes do sexo feminino de melhor nível socioeconômico e com pais que concluíram o ensino médio apresentam mais conhecimentos sobre finanças. Em contrapartida, o menor aproveitamento foi registrado entre os estudantes que habitam em casas com mais de cinco pessoas e com histórico de reprovação escolar.

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