|nº 105| Agosto 2005

Nesta Edição » Investimentos - Entrevista Alberto Dines
A imprensa na Crise Política

Dines: Separar o joio do trigo
Um dos maiores estudiosos do jornalismo brasileiro, para Alberto Dines a imprensa tem feito seu papel, mas com falhas técnicas
A mídia tem papel fundamental na formação da imagem de pessoas e instituições. A respeito da cobertura da crise política e da atuação dos fundos de pensão, a Revista Previ entrevistou um dos maiores estudiosos da imprensa brasileira, o jornalista Alberto Dines.

Qual a síntese que o senhor faz da cobertura da imprensa na crise?
A imprensa está acompanhando isso da melhor forma possível, dentro dos padrões do jornalismo brasileiro; registra a declaração, o fato. Mas não consegue dar uma amarrada geral, separar o joio do trigo. Quando fala dos fundos de pensão, que foram, digamos, usados indevidamente, precisa dizer que o fundo de pensão é um negócio extraordinário que a gente não pode perder.

O atenuante é que há muita coisa, cada dia dois, três desdobramentos, e às vezes novos veios. As redações estão minguando, sem recursos para contratar bons repórteres. Os jornais estão apenas fazendo registros, não um trabalho paralelo de averiguação.

A cobertura é um reflexo magnificado do nosso jornalismo, pois a matéria que deflagrou esse escândalo foi a da Veja. Mas não foi ela que fez. Apenas veiculou vídeo de um araponga, provavelmente a serviço da Abin. Tudo começou via imprensa, mas ela foi passiva, recebeu o vídeo e transcreveu.

Quando o senhor diz que nessa crise não se separa o joio do trigo...
É o caso dos fundos de pensão, por exemplo. Há uma acusação de que foram ou estão sendo usados há muito tempo como pressão política. Não discuto o fato porque não me cabe essa investigação. Agora, falta dizer que o fundo de pensão é algo positivo, a previdência privada no Brasil pode fazer a diferença. Como no Chile, nos Estados Unidos. Tem de se preservar a instituição, mesmo com erros pontuais.

Mas parece que às vezes tenta-se “esquentar” fatos irrelevantes...
Não dá para ser parcial, tem de ver de parte a parte. Há, por exemplo, essa turma que está acusando a operação na Daslu por dizer que o Governo queria tirar os holofotes dos seus próprios problemas. Você vai ter sempre teorias conspiratórias e não adianta. A coisa tem uma velocidade e o negócio é apertado, mas tem de se administrar a crise. O Brasil não pode parar, os fundos de pensão têm de continuar, as estatais têm serviço a prestar.

O quadro é muito difícil, não tem como fazer qualquer coisa a não ser deixar até que apareçam freios naturais, diminuindo a velocidade, as coisas vão aparecendo, as pessoas vão sendo punidas. Acho que o governo já podia ter feito isso antes. Mas essa grande intervenção na direção do PT é uma demonstração de que não está querendo tapar o sol com a peneira. Estou assustado, mas vejo que algumas cabeças ainda estão frias.

O senhor fez um artigo afirmando que falta alguém na CPI. Quem?
É a mídia. Não estou acusando a mídia de ter feito coisas erradas, mas ela não pode se ausentar. Quando saiu a primeira matéria da Veja, escrevi que a revista não poderia fazer apenas a transcrição e dizer que deu um furo. Tem de prestar satisfações à opinião pública, mesmo sem revelar a fonte. A IstoÉ Dinheiro tinha de dizer por que não deu a matéria em setembro, quando estava pronta, com capa feita. E o repórter, o Leonardo Atuch, contou uma lorota no nosso programa: “A gente não tinha as provas, foi esperando, o assunto foi morrendo”. Não é verdade, a matéria não saiu porque o Marcos Valério entrou lá, com grana ou sem grana, e segurou a matéria. E ele próprio disse isso. A mídia tem de ter um papel mais transparente. Não quer ter essa transparência, acaba ficando sob suspeição.

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Foto: José Codeiro/AE