Mais complexo do que se imagina
A falta de experiência e de informações atrapalhou
os investimentos do analista financeiro
Paulo Henrique Augusto Pereira, de 29 anos. Em
dezembro do ano passado, ele decidiu aplicar todas as suas economias na Bolsa de Valores de São
Paulo. Durante seis meses, pesquisou as oportunidades
de negócio pela internet, conversou com
outros investidores e, por conta própria, decidiu
onde investir. Confiante nos resultados da Bolsa,
foi arrojado e apostou os R$ 65 mil que tinha em
papéis de alto risco. Hoje, quase um ano depois,
Paulo perdeu algo em torno de R$ 50 mil.
“Só peguei turbulência. Nos primeiros meses eu
perdia aqui, ganhava ali. Mas, quando a crise norte-
americana aumentou, aí eu só perdi. Eu queria
fazer dinheiro num curto prazo, mas perdi uns 80%
do que tinha guardado. Agora minha visão mudou
em relação à bolsa de valores. Seu funcionamento é
mais complexo do que imaginava. Hoje, teria muito
mais cuidado e não repetiria alguns erros banais
que cometi. Aprendi muita coisa para o futuro,
mas foi um aprendizado caro”, lamenta Paulo, que
não chegou a analisar nenhuma outra forma de
investimento antes de aplicar em ações.
O bancário Márcio Aparecido Soares Ramos, de
30 anos, também aprendeu muita coisa depois que
entrou num fundo de investimento. “Você aplica
pelo site e a única coisa que eles te mandam é um ‘termo de declaração’ que você nem precisa ler.
Depois que investi é que eu comecei a ler os jornais
e ver o que ia render no mercado. Hoje eu sei
que muita informação que tinha era ficção”, conta
Márcio, que tem dinheiro aplicado em fundos de
ações, em fundos DI e na poupança. Ele investiu
na bolsa de valores para comprar sua casa própria.
Por enquanto, em três anos de investimentos, só
teve de retorno o aprendizado.
Para Cláudio Gradilone, os jovens aprendem
na raça o que é ser um investidor porque não têm
assessoria qualificada para auxiliá-los. “A geração
que hoje tem 60, 70 anos viveu um longo período
de inflação e desabastecimento. A pessoa ia para
um concessionário comprar uma Parati preta e saía
com um Gol azul porque não tinha opção nem para
escolher o carro. Hoje, a moçada que está com seus
20 e poucos anos acessa a internet e já está investindo
na bolsa de valores. Muitos se sentem como se estivessem em frente a um videogame. Por isso são
mais propensos a perder dinheiro. São arrojados no
mau sentido, não avaliam o risco”, explica.
Hoje, as opções são múltiplas e vão além do investimento
em Renda Variável. Diversificar sempre foi
um bom conselho repetido a todos os que pretendem
investir. A exposição ao risco deve ser medida
e equilibrada. Para o professor William Eid Júnior,
coordenador do Centro de Estudos em Finanças
da FGV (Fundação Getulio Vargas), o brasileiro
ainda está distante de conquistar o conhecimento
necessário para fazer investimentos. “Os jovens
de hoje estão mais atentos ao mercado financeiro
que as gerações anteriores. Muitos, inclusive, têm
a disciplina de investir no longo prazo. Sabem que
dependem deles mesmos para garantirem seu futuro,
mas ainda estamos longe do ideal”, diz.
Para reduzir essa distância, são importantes
iniciativas como a Ação Jovem, associação criada
em 2003 pela Bolsa de Valores de São Paulo
para auxiliar o jovem investidor. O objetivo é
desmistificar os mercados financeiro e de capitais.
De 2007 para cá, a Ação Jovem já realizou
12 cursos, que contaram com a participação de
aproximadamente 780 pessoas. “Esse é o nosso ‘termômetro’ para medirmos o interesse que os
jovens possuem no mercado financeiro. Além
disso, realizamos algumas reuniões especiais
com profissionais renomados de mercado, assim
como seminários e palestras temáticas. Hoje o
jovem está muito mais informado sobre o mercado,
mas não basta só a informação. É preciso ter
educação financeira e é isso que nossa entidade
tem feito”, explica Eduardo Gomide, diretor da
Ação Jovem da Bovespa.
Emoção na hora de investir
Um dos principais desafios dos jovens investidores é deixar a emoção de lado na hora de aplicar
seu dinheiro. Usar a razão para escolher a melhor
forma de investir não é tarefa fácil para ninguém.
Até porque, independentemente da idade, a grande
maioria dos investidores brasileiros entrou para
o mercado financeiro há pouco tempo e ainda está
engatinhando nesse “novo mundo”.
A psicanalista Vera Ferreira, autora de vários livros
sobre o assunto, diz que é praticamente impossível tomar decisões puramente guiadas pela razão. Com
crise ou sem crise, a emoção tende a falar mais alto
sempre. “Quando o mercado estava bem, as pessoas
tinham uma crença de que nada poderia dar errado
com seus investimentos e que seria muito fácil ganhar
dinheiro. Com a crise, as pessoas acham que
não tem saída. Seja no otimismo exagerado, seja
no pessimismo exagerado, as pessoas se iludem e a
emoção pode atrapalhar”, explica.
A dificuldade de enxergar o cenário como um
todo e ver o lado positivo e negativo dos investimentos
pode ser fatal. Algumas pessoas com mais
idade e experiência podem aprender a lidar com as
emoções e aplicar seu dinheiro com mais segurança.
Outra característica comum aos investidores,
principalmente jovens, é não entender, muitas
vezes, que as perdas do mercado são virtuais até
o momento em que são efetivamente realizadas.
Mesmo que a ação caia de preço em determinado
período, só há perda se
for vendida na baixa. Se for
possível esperar os valores se
recuperarem, o único prejuízo é o estresse sofrido. Muitas
pessoas também costumam
comparar seus investimentos
com o montante que teriam
em momentos de pico, o que
dá uma dimensão irreal. “O
mais correto é comparar o
valor que se tem no momento
da retirada com o aporte
inicial e quanto teria dado
se tivesse optado por outros
tipos de investimento”, analisa
a psicanalista.
São muitas as implicações que o jovem precisa
considerar na hora de investir para evitar aborrecimentos
no futuro. “Não brinco mais, nunca
mais quero saber de investimentos”, pode ser um
sentimento comum em quem se decepciona com
o mercado financeiro. Entender que muitos tipos
de investimento são de longo prazo é fundamental
para não perder dinheiro e nem saúde. “Os jovens
estão cada vez mais preparados para o mercado
financeiro, mas lidar com a emoção é sempre
complicado. São operações mentais primitivas e poderosas, que ignoram o racional. Para dominar
as emoções, a educação financeira não é suficiente. É preciso saber controlar os próprios impulsos”,
acrescenta Vera Ferreira.
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