|nº 116| Julho 06

Nesta Edição » Perdigão - Venda recusada
Por que foi recusada a proposta de compra da Perdigão
A recusa foi motivada pelas próprias condições da oferta: preço inegociável, aquisição de no mínimo 50% mais uma ação, incorporação, fechamento de capital e saída do novo mercado
A oferta pública para a aquisição da Perdigão suscitou o debate de muitas questões importantes, algumas novas e outras nem tanto.
A novidade foi o formato da tentativa de “aquisição do controle” por parte da empresa concorrente. O movimento, conhecido internacionalmente como “takeover” hostil, trouxe ao Brasil o processo de negociação pública e aberta. Para um mercado de capitais de propriedade bastante concentrada, acostumado a negociações privadas entre grandes acionistas, onde os minoritários em geral só tomam conhecimento sobre o destino das empresas depois que está tudo acertado, a novidade é relevante, e acredito que bem-vinda.

Unidade Rio Verde

Na verdade, a novidade só surgiu por que a Perdigão fez o movimento recente de adesão ao Novo Mercado, criando uma companhia moderna, com uma única classe de ações, com direitos iguais (econômicos e societários) para todos os seus acionistas. Ainda que o grupo controlador anterior remanesça com parcela significativa do capital da empresa e um acordo de voto (situação transitória e publicamente conhecida), a Perdigão tornou-se a empresa “a ser observada”, tanto pela sua capacidade de crescimento em novas bases quanto pela sua formatação societária inovadora.

Mais aberta e transparente, a empresa também estará mais sujeita a debates públicos sobre seu futuro e eventualmente a novas ofertas e transações, das quais seja parte ativa ou passiva. No entanto, não se deve confundir em nenhum momento esta situação de maior transparência com fragilidade ou com facilidade para a tomada da empresa. Ao contrário, a idéia de empresas de controle pulverizado pressupõe empresas mais fortes, mais conscientes do valor que representam e dos interesses dos acionistas que nela apostaram seus recursos. Em empresas deste tipo, não só os acionistas mas também os executivos assumem um papel de defesa legítima dos valores sob sua guarda e direção.

Valor e Eqüidade. Estas são as palavras-chaves por trás de tantas regras e interpretações sobre o Novo Mercado. O objetivo das empresas tem que ser criar valor e distribuí-lo da maneira mais eqüitativa possível entre seus investidores e colaboradores. Seja por investimentos próprios, seja em transações de aquisição, fusão ou venda, o horizonte tem que ser a criação de valor para todos.

Reside aí a principal razão da recusa dos maiores acionistas da Perdigão pela oferta da concorrente. A proposta não reconhecia o devido valor da empresa tal como ela é hoje. E, ainda mais, se a proposta tinha a intenção de criar mais valor a partir da união das duas empresas, é justo que este valor adicionado fosse melhor capturado por todos, num modelo mais moderno e promissor. E se este projeto pudesse ser realizado preservando as conquistas recentes de governança, ou seja, se pudesse representar o avanço de todas as partes para o Novo Mercado, não seria bem melhor?

No que diz respeito às interpretações sobre o novo Estatuto da Perdigão, é razoável imaginar que cada parte tentou interpretá-lo da forma que fosse mais favorável aos seus objetivos. De nossa parte, como acionistas relevantes da Perdigão, a resposta tempestiva e firme não deve ser confundida com desrespeito, irritação ou indisposição para o dialógo. A recusa foi motivada pelas próprias condições da oferta: preço inegociável, aquisição de no mínimo 50% mais uma ação, incorporação, fechamento de capital e saída do novo mercado. Por que os acionistas da Perdigão deveriam demorar para responder, mantendo incertezas e gerando instabilidade para sua própria empresa se a oferta não admitia nenhuma flexibilidade? A resposta foi óbvia, correta e tempestiva: a prioridade foi defender a empresa-alvo e o seu valor.

Ademais, o viés da interpretação da ofertante fica claro quando se percebe que foi invocada uma regra do artigo 37 para induzir a Perdigão a contratar uma avaliação da empresa. Entretanto, a ofertante não se sentia obrigada a honrar essa avaliação, uma vez que antecipadamente declarou que, caso o preço apurado fosse maior que o ofertado, ela estaria cancelando a oferta. Ora, quer dizer então que a regra seria impositiva apenas para um lado? Não é para isso que o Estatuto foi criado.

Outra questão suscitada, esta não tão nova, diz respeito à criação de empresas brasileiras com capacidade de competir na economia globalizada, ainda que estas empresas fiquem relativamente grandes para o mercado interno. Este é um velho, mas bom e atual debate. E estamos alinhados com quem pensa que temos o direito de pensar grande.

Sérgio Rosa, Presidente da PREVI
Renato Chaves, Diretor de Participações da PREVI