|nº 132| Mai 08

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Plano de Benefício foi feito para proteger participante

Ricardo Pena, secretário de Previdência Complementar, fala do que está sendo feito para garantir a boa situação dos fundos de pensão

Há poucos meses como titular da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), órgão encarregado de fiscalizar as Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), como a PREVI, Ricardo Pena fala da criação da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), cujo projeto se pretende encaminhar ao Congresso Nacional. Fala também sobre regras para a distribuição do superávit das instituições e sobre mudanças na regulamentação dos fundos. Veja os principais trechos da entrevista concedida à Revista PREVI.
Revista PREVI – Como está o processo de criação da Superintendência Nacional de Previdência Complementar, a Previc?
Ricardo Pena –
O anteprojeto de lei encontra-se na área de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, onde estão sendo feitos os cálculos das carreiras do futuro órgão regulador dos fundos de pensão. Como essa futura autarquia ou superintendência, substituta da SPC, terá uma carreira de auditores fiscais, com atribuição exclusiva de fiscalizar os fundos, além de uma carreira de especialistas – para analisar as autorizações e licenciamentos – e ainda uma carreira de analistas, de pessoal administrativo e de procuradores, o Ministério do Planejamento está calculando o impacto que essa medida terá, em termos de gastos, para o governo. Dessa vez, estamos encaminhando-o na forma de projeto de lei, com o objetivo de estruturar um órgão de fiscalização que tenha alguma estabilidade. E também que tenha uma estrutura estável, autárquica, com independência financeira, administrativa, com quadros próprios e especializados. Queremos que a previdência complementar tenha seus alicerces mais bem estabelecidos, mais institucionalizados. Nos últimos cinco anos, fizemos um trabalho bom, em termos de supervisão e de regulação, mas em termos de estrutura nós estamos com uma base ainda um pouco frágil, que necessita ser reforçada com a criação da Previc.
Revista – Quais as diferenças da Previc em relação à SPC?
Pena –
Uma delas é a possibilidade de ser dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimônio próprio, vinculado ao Ministério da Previdência Social, com sede no DF e atuação em todo o território nacional, onde atuaria como entidade de fiscalização e de supervisão das atividades das Entidades Fechadas de Previdência Complementar e da execução das políticas para o regime de previdência complementar.
Eu acrescentaria que, além disso, a antiga MP 233 visualizava e o atual projeto de lei mantém a possibilidade de criação de um órgão no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Complementar (atual CGPC) e que funcionaria como uma instância recursal: a Câmara de Recursos da Previdência Complementar.
Diferentemente da SPC, a Previc terá um quadro próprio de funcionários a ser constituído ao longo dos próximos anos: 212 auditores, 50 procuradores, 120 especialistas, 100 analistas e 80 técnicos, aqui incluídos especialistas em previdência complementar e pessoal administrativo.
Atualmente, a SPC trabalha com auditores cedidos por outros órgãos, sobretudo da Receita Federal. A Previc contaria ainda com uma Procuradoria Federal, uma Ouvidoria e uma Corregedoria próprias. E isso é importante, na medida em que, atualmente, a SPC depende desses órgãos do Ministério da Previdência Social, já assoberbado com os assuntos da Previdência Social.
A Previc será administrada por uma Diretoria Colegiada, composta por um diretor-superintendente e quatro diretores, “escolhidos entre pessoas de ilibada reputação e de notória competência, a serem indicados pelo ministro da Previdência Social e nomeados pelo Presidente da República”. Outra vantagem será a possibilidade desse órgão fiscalizador possuir um orçamento próprio, resultando de uma taxa de fiscalização, a Tafic, arrecadada junto aos fundos de pensão. Isso significaria que a Previc teria orçamento anual de R$ 35 milhões, em lugar dos atuais R$ 2 milhões conferidos pelo orçamento da União à SPC.
Custeada pela Tafic, o Estado se desonera. Bancada pela SPC, pelo orçamento público, é toda a população que está pagando para um segmento de 3% da população economicamente ativa. Então acho que seria mais justo, do ponto de vista orçamentário, cobrar apenas de um determinado grupo. Até porque essa é a metodologia adotada por todos os países que têm previdência complementar.
A isso acresce-se o fato de essa autarquia passar a ser autofinanciável. A Previc, com uma estrutura mais robusta, inclusive com seu potencial de mais de 300 funcionários, poderá ter uma regulação mais flexível e uma supervisão mais inteligente, porque tal estrutura perpassa governos e estaria imune a qualquer ação que não fosse para o desenvolvimento e fortalecimento da previdência complementar.
Revista – O senhor declarou que seria necessário usar o período de “bonança” por que passam os fundos de pensão para “preparar um colchão” para eventuais problemas no futuro. Que cuidados seriam esses?
Pena –
Eu estava me referindo à questão do superávit. O superávit está em R$ 76 bilhões, de acordo com os dados de dezembro de 2007, sendo que R$ 43 bilhões são de reserva especial para ajuste do plano. Está além do colchão dos 25% de reserva especial. Em tese, pela lei complementar, decorridos três anos, esse recurso poderia ser utilizado para reduzir a contribuição ou para aumentar o benefício. Até porque estamos tratando de uma situação de desequilíbrio, algo anormal no sistema, já que sempre nos preparamos para enfrentar os déficits e as dívidas. Em tese, o plano de benefício não foi feito para enriquecer o participante. Ele foi feito para proteger o participante na fase não laborativa.
É desequilíbrio, eu costumo dizer, num momento de bonança. É um bom problema, mas é um problema a ser enfrentado. Ali tem interesses legítimos de participantes, assistidos e patrocinadores. Uma questão importante é que, nos últimos cinco anos, a economia ajudou muito os fundos. A rentabilidade está muito grande. Comparado a 2002, naquele período o sistema estava com déficit de R$ 20 bilhões. Hoje está com superávit de R$ 76 bilhões. Então a gestão foi muito boa. As condições econômicas também. E essa questão do superávit tem que ser vista em uma linha da preocupação com a maior solvência e solidez do plano de benefícios.
Revista – E quanto às regras/critérios para distribuição de superávits?
Pena –
É preciso definir o que é superávit e a forma de apuração desse superávit. O que a SPC pretende, assim que sair o Plano de Contas, é ter uma regulação mais firme sobre a questão da destinação do superávit e também sobre o equacionamento do déficit. Até lá, o que a gente pretende, no âmbito do Conselho de Gestão de Previdência Complementar (CGPC), é poder regular a matéria para as entidades. Seria mais uma medida no âmbito de orientação, que pode sair na forma de recomendação ou resolução para que as entidades, antes de pensarem em destinar o superávit, possam percorrer uma lista do ponto de vista de maior prudência e mais conservadorismo. Por exemplo, para destinar o superávit teria que se ver primeiro como é que está a dívida do patrocinador daquele fundo. Há entidade que tem dívida e está querendo destinar o superávit. Seria prudente fazer isso? Existem vários pontos que precisam ser equacionados antes de se pensar nessa destinação. A minha idéia é levar essa discussão para o CGPC, para que dali saia uma deliberação com orientação para os fundos.
Revista – Como atender às expectativas dos associados para a melhora de benefícios?
Pena –
Com o cumprimento dos aspectos legais e com a gestão prudencial dos recursos previdenciários
das EFPC.
Revista – O senhor também falou em certificação dos dirigentes dos fundos de pensão. Como seria esse processo?
Pena –
A Certificação dos Dirigentes, conforme prevê a Lei Complementar 109/01, artigo 35, para atuar nas áreas financeira, atuarial, jurídica, contábil, administrativa e de auditoria tem sido praticada pelo mercado financeiro e de capitais. Os regimes próprios de Previdência, no âmbito da Secretaria de Política de Previdência Social (MPS), e os dirigentes vinculados aos fundos de pensão, não podem ficar a reboque desta nova realidade que se impõe.
O que se pretende com a certificação é um impulso, é o alinhamento às melhores práticas na gestão de recursos financeiros e previdenciários de terceiros.
A idéia é que a regulação possibilite formar esses estoques de dirigentes num horizonte de quatro anos. A SPC entende que isso é positivo, do ponto de vista de melhoria nos processos e também no desempenho do próprio fundo.
Haveria inclusive uma avaliação como tem a Ancor e a Anbid, destinada a medir o conhecimento daqueles dirigentes num prazo de quatro anos. Essa certificação poderia ser gradual e por gradientes de envolvimento do Conselho Fiscal, Conselho Deliberativo e da Diretoria Executiva, diante das diferenças de certificação de cada um. Seria avaliado o conhecimento de previdência, de algumas operações no mercado financeiro, conhecimento de atuária, conhecimento jurídico, de auditoria, gestão, e de governança. Seria um nivelamento dos dirigentes. A idéia, com isso, é aumentar, dar um outro patamar, em termos de qualidade de gestão nos fundos de pensão. Eu acho que dentro dessa agenda de educação financeira e previdenciária essa iniciativa vai ajudar o desenvolvimento do sistema.
Revista – Uma de suas preocupações é com relação à avaliação de riscos para os fundos. Como esses mecanismos podem ser aprimorados?
Pena –
A resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que aprovou, em maio de 2007, a nova regra de aplicação dos recursos administrados por fundos de pensão, que ultrapassam R$ 410 bilhões, refletiu o amadurecimento do sistema de previdência complementar, permitindo, de forma equilibrada, maior flexibilidade na gestão dos recursos pertencentes aos planos de benefícios administrados pelos fundos de pensão. Para o futuro, em primeiro lugar, cito a revisão do plano de contas, um dos poucos itens ausentes de regulamentação. O objetivo, ao discutir o tema, é aumentar a visibilidade e transparência das operações dos fundos, dando tratamento, por exemplo, para a questão das dívidas dos patrocinadores ou para as despesas administrativas.
Outro ponto que merece regulação é a nova metodologia de fiscalização – a supervisão baseada em risco –, inicialmente desenvolvida com o Programa Anual de Fiscalização para identificar esses riscos e melhor alocar os fiscais. Também temos a fiscalização indireta que monitora as informações eletrônicas de investimento, atuária e contabilidade para municiar a fiscalização direta.
Aponto ainda, como tema pendente de regulação, o resseguro: uma opção que as entidades podem fazer para reforçar a solvência do plano. Estamos em negociação com a Susep – órgão também envolvido no setor – e já identificamos alguns produtos que poderão ser utilizados para reforçar a solvência dos planos de benefícios administrados pelos fundos de pensão como a troca de tábua de mortalidade e a oferta de garantias e de seguro para benefícios de risco – invalidez e morte – e até mesmo para eventos catastróficos.
Revista – Nos últimos anos, a SPC tem atuado para melhorar e atualizar a legislação nessa área. Quais serão os próximos passos?
Pena –
Há uma microagenda regulatória, que precisa ser encaminhada. Primeiro é o plano de contas, e alguns outros assuntos pendentes; acho que essa será a última regulação em termos de melhoria regulatória, de aperfeiçoamento regulatório. Além da Previc, que trata de uma agenda transversal, ainda temos uma frente de trabalho no campo microrregulatório, que é: (I) a definição da nova planificação contábil, alinhada ao novo padrão de convergência contábil internacional, prevista para 2010; (II) as despesas administrativas, tendo em vista que a norma atual é anacrônica na medida em que limita a visibilidade das operações dos fundos de pensão; (III) a definição de superávit e déficit, já que o momento é extremamente favorável para essa discussão, tendo em vista os excelentes resultados obtidos pelos fundos de pensão; (IV) a título de fomento, um novo regramento para as transferências de gerenciamento de planos, Convênio de Adesão Migração de Planos; (V) a regulação da nova metodologia de fiscalização, a SBR/Supervisão Baseada em Riscos; e (VI) resseguro.
Revista – Com a regulamentação atual e a fiscalização que existe os participantes dos fundos de pensão podem se sentir seguros em relação ao recebimento de seus benefícios?
Pena –
Sim, os fundos de pensão, enquanto investidores institucionais, e cumpridores do dever fiduciário, podem se sentir seguros, mas devem estar atentos a essa nova realidade econômica que passará por um processo de diversificação dos investimentos e por uma boa gestão de riscos, sendo oportuno, então, a necessidade da educação financeira com objetivos previdenciários.
Nesse sentido, a educação previdenciária articula-se com outro objetivo estratégico da SPC, pois fortalece indiretamente a fiscalização do sistema fechado de previdência complementar, seja a partir da educação dos participantes e assistidos, seja pelo desempenho dos Conselhos (Fiscal e Deliberativo) da EFPC e pelas melhores práticas de gestão dos dirigentes.
A perspectiva é que todo o trabalho desenvolvido pela SPC, desde 2003, seja consolidado com a criação de uma estrutura de supervisão, um órgão de Estado, nos moldes da Previc, que esteja comprometida com políticas de longo prazo, com quadros técnicos próprios e especializados, que esteja imbuída de ações governamentais estáveis, promova o desenvolvimento do sistema de previdência complementar e possa reforçar a segurança e a solvência dos planos de benefícios de modo a garantir os direitos dos participantes e assistidos das EFPC.