|nº 136| Set 08

Nesta Edição » Capa » Crise: maior, mais longa e mais complexa do que se imaginou

A limitação das previsões
Contada assim, simplificada e resumida, a história da crise parece fácil de entender. Tornase até tentador afirmar que o desfecho atual era óbvio e, mais tentador ainda, perguntar: como é que ninguém enxergou isso antes?
Parece ser consenso de que a crise era previsível, mas, sua dimensão, não. Em entrevista à Revista PREVI, em abril, o economista do BNDES, Antonio Prado, afirmou que “a crise norte-americana é a típica crise de uma morte anunciada. Os economistas vêm há vários anos alertando para essa bolha imobiliária que estava se formando, mas as autoridades não tomaram nenhuma medida preventiva, como mudanças regulatórias”.
Na mesma linha de pensamento, está Paul Krugman, colunista do jornal The New York Times, que escreveu recentemente: “o correto, claro, seria ter tomado medidas preventivas antes de atingir este ponto. Quando o Bear Stearns afundou, muitos falaram da necessidade de um mecanismo de liquidação ordenada para os bancos de investimento em crise”. José Sheinkman, professor de economia na Universidade de Princeton (EUA), declarou à jornalista Sonia Racy, de O Estado de S.Paulo, que esperava o estouro da bolha imobiliária há quase quatro anos, “mas não do tamanho que a crise mostra”.
Para o economista Cláudio Adilson Gonçalves, da MCM Consultores Associados, “havia sinais desde meados de 2007, mas a real extensão não foi corretamente avaliada por ninguém, nem pelas autoridades econômicas americanas. Para fazer justiça, a única exceção talvez tenha sido o professor Nouriel Roubini, da Universidade de Nova Iorque. Foi ele quem chegou mais perto, mas suas previsões foram tidas como catastróficas”.
Em momentos de crise, paira a incerteza generalizada sobre a gravidade, seus impactos, sua abrangência e sua duração. Nos últimos meses, não foi raro ver respeitados especialistas fazerem diagnósticos que hoje são derrubados pelos fatos.
Para ilustrar como analisar cenários é tarefa árdua, o site Infomoney publicou, em maio, projeções para o Ibovespa em dezembro de 2008, feitas por 27 das mais conceituadas corretoras atuantes no mercado brasileiro. As projeções variavam entre 72 mil pontos e 86 mil pontos. Na data em que esta matéria é escrita, em meados de setembro, a Bovespa está operando na casa dos 50 mil pontos. Muito abaixo da mais pessimista das expectativas. Quem explica é Fausto Gouveia, analista da corretora Wintrade, em declaração à Agência Estado: “No começo do ano, tínhamos a crise do subprime, e não uma crise financeira. Mas ela se espalhou para outros setores da economia dos EUA e para outros países, criando um ambiente de aversão ao risco”.
Alessandra Montini, professora de finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA-USP), declarou ao jornal Valor Econômico que “Crises são como epidemias. Sabemos muito bem como combater a última delas, mas não temos muita idéia do que está por vir”. Toda crise tem um componente alto de imprevisibilidade. Desde os primeiros sinais em 2007 até hoje, houve limitações coletivas para enxergar a profundidade da crise. E, conseqüentemente, dificuldade ainda maior para saber como e quando agir para evitar impactos maiores.
Além da dificuldade de prever o que iria acontecer com a economia americana, um outro fator pesou para manter o otimismo econômico em alta, mesmo com os primeiros sinais da crise pipocando. Nos últimos cinco anos, as chamadas “economias emergentes” passaram a apresentar um desenvolvimento e um crescimento muito acima das economias mais desenvolvidas. Os BRICs (como ficou conhecido o conjunto formado por Brasil, Rússia, índia e China) tornaram-se o símbolo de uma nova fase da economia mundial, em que o dinamismo econômico deslocou-se para novas regiões de maneira jamais vista. Com uma economia global mais diversificada, ficou mais difícil fazer previsões sobre impactos e conseqüências de crises localizadas, ainda que a crise ocorresse no centro financeiro mais importante do mundo.

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