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A Matemática financeira é simples

Um dos mais respeitados na área de Matemática Financeira, o economista José Dutra Vieira Sobrinho, vice-presidente da Ordem dos Economistas do Brasil, é autor de livros como o Manual de Aplicações Financeiras – HP 12C e participa como colaborador de matérias jornalísticas dos principais meios de comunicação do país.
Nesta entrevista exclusiva, fala da falta de cultura de planejamento no longo prazo do brasileiro médio e da importância de fazer orçamento pessoal de forma correta e conhecer regras básicas da matemática financeira. Dutra também destaca que, hoje, é cada vez mais importante a preocupação com a previdência complementar, porque "Antes o Estado era o pai de todos. Todo mundo vivia da aposentadoria oficial e não se preocupava com o futuro. Hoje, claro, quando se aposenta com 1 ou 2 salários mínimos, tem uma dificuldade enorme para se manter". Veja os principais trechos da entrevista a seguir.

Revista PREVI – Muitas pessoas, principalmente os mais jovens, têm dificuldade em fazer planos para a aposentadoria. Qual a importância de começar a fazer uma "reserva" cedo?

José Dutra Sobrinho – A dificuldade em matéria de previdência decorre, primeiro, de uma falta de tradição. O brasileiro, em geral, não foi educado para poupar. Às vezes, se dispõe a colocar dinheiro na poupança para comprar algo que deseja. Por exemplo, um carro daqui a cinco anos. No ano seguinte, saca tudo e compra uma bicicleta. Mas isso está melhorando. Sempre cito que no mercado financeiro existem milhares de operações, mas quatro que são as mais desconhecidas do grande público. Primeiro, pelo grau de importância, o financiamento habitacional. Ainda hoje se tem muita dificuldade por tudo aquilo que aconteceu no passado, o sujeito pagava, pagava e nunca zerava o saldo.

O segundo produto que as pessoas têm grande dificuldade para assimilar é o fundo de previdência, pelo desconhecimento generalizado sobre ele, principalmente na parte de tributação, que ainda é muito confusa mesmo para quem tem bom grau de informação. E há dois outros produtos que não vamos falar deles aqui em profundidade, mas são os campeões em matéria de desconhecimento, o título de capitalização e o consórcio. Mas vamos ficar no fundo de previdência. O problema é que as pessoas não sentiam a necessidade de contribuir para que quando seaposentassem tivessem os recursos para complementar renda para sobreviver. Isso está mudando, mas ainda continua forte esse entendimento. O que as pessoas têm dificuldade de imaginar é que uma contribuição, mesmo que pequena, depois de trinta anos transforma-se num saldo razoável. Vamos imaginar que se contribua com R$ 70 por mês por trinta anos, considerando rendimento de 0,5% real ao mês, isso se transforma em R$ 70.668 no final do período.

Revista – Parte dessa falta de cultura financeira advém de nosso passado inflacionário, em que não era possível planejar o futuro em prazo tão longo...

José Dutra – Esse exemplo é interessante. Quando trabalhei no Unibanco, há 35 anos, só conhecia uma única pessoa que fazia um orçamento doméstico. Ele trabalhava na mesma área que eu e anotava tudo que gastava, até esmola na rua. Com isso queria fazer projeções para os meses seguintes, só que a inflação era muito alta, de 10%, depois 15% ao mês. E a inflação alta impede a pessoa de fazer qualquer tipo de controle. Mas com a moeda estabilizada de alguns anos para cá, e que promete ficar mais ou menos nesse patamar, é possível para qualquer pessoa fazer um orçamento, planejar, mas o que ainda falta é tradição.

Revista – E qual a importância desse planejamento de longo prazo?

José Dutra – Esse planejamento dá às pessoas uma visão daquilo que pode fazer, das despesas que pode cortar. Você vê nas empresas a importância de um orçamento equilibrado, mas isso não é muito diferente para pessoa física. O que prego muito nas palestras que faço é que as pessoas tenham um mínimo de controle, que façam seu orçamento com a família. O problema é que muitas vezes comete-se um erro. O marido e a mulher anotam suas despesas, começando pelas maiores, como aluguel, condomínio, plano de saúde, mensalidade escolar, depois gastos com carro, supermercado etc. Vai rabiscando, depois soma. No final deu, por exemplo, R$ 3.500, e a pessoa se questiona: mas eu ganho R$ 5 mil líquidos e está faltando dinheiro? Para onde está indo? Na realidade está fazendo o orçamento de maneira incorreta. O aconselhável é a pessoa anotar, dia a dia, tudo o que gastou no mês. No último dia, ao somar, vai ter uma surpresa porque a soma das pequenas despesas, uma cerveja, um estacionamento, uma passagem, tem valor significativo. Usando esse método, vai se aproximar efetivamente do que gasta. Precisa fazer todo mês a mesma coisa? Não, no máximo por três meses, depois já tem o domínio dos gastos em linhas gerais e pode se controlar melhor. Muita gente se surpreende quando faz isso.

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