|nº 114| Maio 06

Nesta Edição » Aposentados - Associados centenários
Colegas Centenários

Aos 101 anos, Enoch e Hildegardo têm diversas coincidências em suas vidas, entre elas serem os dois associados há mais tempo na PREVI

Segundo o IBGE, existem no Brasil 25 mil pessoas com 100 anos ou mais. Entre elas, os associados há mais tempo da PREVI, Enoch Periandro de Oliveira e Hildegardo Doria Mendonça, ambos com 101 anos. As coincidências vão longe, os dois moram no Rio de Janeiro, mas são nordestinos e se aposentaram no cargo de inspetoria. Na Agência Matriz Carioca, na Praça 1º de Março, chegaram a ser colegas de trabalho.
Enoch nasceu em 28 de outubro de 1904, em Santa Rita, Paraíba. Até hoje, não tem problemas de saúde crônicos nem necessidade de medicação – exceção feita a alguns complementos e vitaminas – e possui disposição de sobra para caminhadas diárias na praia de Copacabana, onde vive. Atribui a boa saúde a três fatores: fé nos deuses e na natureza, leitura de livros e de dois jornais diariamente e um bom vinho aos finais de semana. Mas deixa claro que nunca abusou da bebida, principalmente da cachaça. Em casa, passa bom tempo apreciando a vista da praia da sala do apartamento, observando o trajeto dos navios cargueiros. Mesmo contando com o auxílio da única filha, Luiza, e de uma enfermeira, é ele quem arruma sua cama e tranca a porta do apartamento.

Enoch fala com orgulho do tempo em que passou pelo Banco do Brasil: “A melhor coisa que aconteceu na minha vida”. Autodidata em contabilidade, começou a trabalhar aos 14 anos, na empresa de construção civil de um dos oito irmãos. Prestou concurso e tomou posse no Banco em Recife, em 1930, onde dois de seus irmãos já trabalhavam.


Enoch: no BB, o melhor tempo da minha vida
Em 1934, quando os funcionários tiveram de decidir se permaneciam na Caixa de Previdência, então chamada de Capre, ou optar pelo IAPB (Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Bancários), logo preferiu a primeira, tornando-se fundador-contribuinte da PREVI. “A Caixa tem uma estrutura formidável, muito organizada, de sorte que não tive muitas dúvidas”, recorda. Passou por vários cargos até chegar à inspetoria, função que permitiu conhecer diversas cidades do País, como Maceió e Fortaleza. Da capital do Ceará, Enoch guarda só boas lembranças.

“Uma cidade dourada, com clima bom, e foi lá que meu pai construiu diversos açudes e represas no sertão”, conta. Aos 30 anos veio ao Rio de Janeiro de férias, onde se hospedou com um colega. Permaneceu na cidade, mantendo uma vida regrada, onde nasceram três netas e um bisneto. De lá para cá já se passaram mais de sete décadas. Ele conta que quando começou a trabalhar, já havia máquinas de escrever em todas as mesas e logo chegaram máquinas de calcular. A merecida aposentadoria veio em 1960.

Vida de poeta

Hildegardo Mendonça é sete meses mais novo que Enoch, mas diz ter 102 anos porque conta o ano já começado e incompleto. Casado há 62 anos com Olga, tem três filhas, cinco netos e dois bisnetos. Conhecido como Seu Mendonça, passou o dia ansioso à espera da visita da reportagem, a ponto de não conseguir fazer o trabalho de fisioterapia. Falou pouco de início e só se soltou quando revelou o segredo: “Sou poeta”. Durante anos, escreveu e arquivou poemas, crônicas e contos, dedicados à esposa, ao trabalho, às filhas, genros... Tudo é guardado em seu “tesouro”, um armário com pastas cheias de recortes, de que se encarrega pessoalmente em manter organizado.

São oito livros encadernados artesa-nalmente e uma coletânea, Pedaços de Mim vol. I, publicada em dezembro, com lançamento na sede da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB). O segundo volume está pronto, aguardando apenas a edição gráfica. Até hoje, mantém a máquina de escrever Remington portátil, adquirida em 1956, onde escreveu seus versos. “Alguns alegres, a maioria tristes que retratam as dores do mundo”, segundo o verso que fez para a companheira. Mas, atualmente, a máquina só vai para a mesa para redigir cartas à nora, que mora em Salvador.

Após o centenário, em 2005, seu Mendonça relutou em aceitar a recomendação médica de implantar um marca-passo, porque “não queria que mexessem no velho coração”. Depois do tratamento, teve alta. “O médico me dispensou, disse que só precisava procurá-lo se sentisse algum incômodo”, revela com sorriso no rosto.
Alagoano de Penedo, cidade às margens do rio São Francisco, conta ser contemporâneo do cangaceiro Lampião. “Mas não tive oportunidade de me encontrar com ele. Outros tiveram”, diverte-se. A cidade, criada como fortaleza holandesa no século XVII sobre um rochedo, é marcada pelo casario histórico bem conservado. Foi o local onde Seu Mendonça iniciou carreira no BB, em 1925. Depois, tornou-se gerente em São Félix, na Bahia, e em Goiânia, onde nasceu a primeira filha.

De lá foi para uma primeira passagem pelo Rio de Janeiro, no Departamento de Contabilidade da matriz. Em 1954, tornou-se inspetor, e foi enviado para Presidente Prudente e Assis, no interior de São Paulo, período que mais o agradou dentro do Banco. Aposentou-se em 1972, e ainda trabalhou no Banco Continental e na Superintendência Nacional da Marinha Mercante (Sunamam) por 14 anos. No período, foi convidado de honra do BB para a inauguração de agências em Los Angeles, nos Estados Unidos, e em Paris, na França. Hoje, vive com a esposa num apartamento adquirido com financiamento da Carim.

Hildegardo: sou poeta